Resumo:
O presente artigo tem como objetivo analisar a Lei de Igualdade Salarial entre Mulheres e Homens (Lei nº 14.611/23), sancionada em julho de 2023, abordando os aspectos legais que embasam essa importante medida, que visa coibir a disparidade salarial de gênero e promover a equidade no mercado de trabalho.
Ainda, será exposto, ao longo deste texto, a nova obrigação regulatória imposta às empresas com mais de 100 empregados, de apresentar relatório de transparência salarial, semestralmente, como ferramenta de transparência e fiscalização dos ditames trazidos pela Lei. Nesse contexto, a observância rigorosa dos requisitos legais e a adoção de boas práticas são cruciais para a efetividade do relatório, conforme será abordado abaixo.
I. Introdução:
A desigualdade salarial entre homens e mulheres é um problema histórico que vem sendo enfrentado em escala global, por diferentes agentes da sociedade civil, governos e empresas. No intuito de combater essa questão e promover a igualdade de gênero no âmbito profissional, foi sancionada a Lei de Igualdade Salarial entre Mulheres e Homens.
Referida lei encontra respaldo no artigo 5º da Constituição Federal, que estabelece que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, proibindo qualquer forma de discriminação por gênero. Além disso, o artigo 7º, inciso XXX, do mesmo texto, assegura a igualdade de salário para trabalho de igual valor, sem distinção de sexo. Assim, a nova lei reforça esses princípios constitucionais, buscando efetivar essa igualdade na prática e garantir que as mulheres não sejam prejudicadas financeiramente devido ao seu gênero.
II. Princípios da Nova Lei:
A Lei de Igualdade Salarial entre Mulheres e Homens estabelece uma série de princípios para garantir a efetivação da igualdade salarial. Dentre os quais, se destacam:
- Proibição da discriminação salarial com base no gênero;
- Estabelecimento de critérios objetivos para aferir a igualdade salarial;
- Transparência salarial, exigindo que as empresas divulguem informações sobre os salários de seus empregados.
III. Impactos Sociais e Jurídicos:
A nova lei terá impactos significativos na sociedade e no cenário jurídico brasileiro. Em termos sociais, contribuirá para a redução da desigualdade de gênero, estimulando a
participação das mulheres no mercado de trabalho. No âmbito jurídico, a lei fortalece o arcabouço legal de combate à discriminação de gênero, uma vez que os dados da Justiça do Trabalho apontam que, em 2022, a equiparação salarial ou a isonomia foi objeto de 36.889 processos ajuizados em todo o país. Sobre promoção relacionada a diferenças salariais, o total foi de 9.669 processos.
IV. Relatório de transparência:
Conforme discorrido, a nova lei se dedica à questão da equiparação salarial e dos critérios de remuneração entre os gêneros masculino e feminino e traz uma nova obrigação: empresas com mais de 100 empregados terão a obrigação de divulgar, semestralmente, relatórios detalhados sobre a transparência salarial e os princípios remuneratórios adotados.
Esse relatório representa a concretização de um aspecto essencial das práticas ESG, centrado no aspecto social. Dada a importância e as possíveis consequências de não cumprimento de tal obrigação, é imperativo que as empresas se empenhem na prestação das informações via relatório.
Nesse sentido, as empresas devem verificar quais funcionários estão em situações legalmente equivalentes, posteriormente, aplicar cálculos matemáticos que possibilitem a comparação. Ademais, importante frisar que, caso haja funcionários em situações iguais, mas salários diversos, a empresa deve documentar e justificar essa situação em seu relatório.
No entanto, a Lei não determina de forma clara quais são as exigências específicas para a elaboração desse relatório, deixando margem para interpretação e adaptação.
Dessa forma, diante da falta de regulamentação específica, devem ser produzidos relatórios que observem os princípios trazidos pela Lei ora questão. A título de exemplo, elencam-se alguns pontos que se entende serem fundamentais:
- Classificações dos cargos em níveis de complexidade (desde níveis operacionais até níveis de liderança); estabelecendo critérios de diferenciação entre os funcionários de cada cargo.
- Segmentar os cargos em perfis, dividindo impactos e complexidade.
- Estabelecer referencias de remuneração para cada nível e para cada perfil de cargo, dessa maneira, será possível construir uma tabela com faixa salarial distinta que reflita a progressão do cargo em questão.
- Após, importante informar o nível de cada cargo e a tabela com faixa salarial, de forma clara e acessível, permitindo que os funcionários compreendam os critérios utilizados para a definição dos salários e identifiquem possíveis disparidades.
- Além disso, é de suma importância incluir dados desagregados por gênero, bem como outras variáveis relevantes, como idade, tempo de serviço e nível educacional.
- O relatório deve destacar as ações adotadas pela empresa para promover a equidade salarial e combater a discriminação de gênero.
V. Multa por descumprimento
Os relatórios deverão ser fornecidos para fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego. As informações deverão permitir aos fiscais comparar os valores recebidos por mulheres e homens, observada a legislação de proteção de dados pessoais. Caso o relatório não seja apresentado, caberá multa de até 3% da folha de salários, limitada a cem salários-mínimos (hoje, R$ 132 mil).
Por fim, a nova lei alterou a multa prevista no artigo 510 da CLT, para as empresas que não pagarem o mesmo salário para homens e mulheres que desempenham a mesma função. A partir de agora, o valor será dez vezes o novo salário devido pela empresa à trabalhadora ou ao trabalhador discriminado.
Considerações finais
A promulgação da Lei nº 14.611/2023 marca um passo importante na busca pela igualdade salarial no Brasil. Além de reforçar as disposições já existentes na legislação trabalhista, a Lei introduz medidas mais rigorosas e inovadoras para combater a discriminação salarial e promover a transparência nas práticas remuneratórias das empresas. A obrigação de publicar relatórios semestrais de transparência salarial representa um avanço significativo, permitindo uma avaliação objetiva das disparidades de gênero, entre outras, no mercado de trabalho.
Para cumprir essas exigências de maneira eficaz, as empresas podem adotar metodologias que utilizam razões matemáticas para comparar salários de mulheres e homens em situações legalmente equiparáveis. Essa abordagem, embora desafiadora, permite uma avaliação mais precisa e minimiza o risco de violações legais.
No entanto, a falta de regulamentação específica para a elaboração desses relatórios deixa margem para interpretação e exige adaptações para cada empresa. À medida que o governo federal publique regulamentações mais detalhadas, as empresas precisarão ajustar seus procedimentos de acordo.
Em última análise, a Lei 14.611/23 representa um importante passo em direção à igualdade de gênero e à transparência no mercado de trabalho, mas sua aplicação eficaz dependerá da cooperação e do compromisso das empresas em seguir as orientações legais e regulatórias em constante evolução.
Por Sandy Fredericci